sexta-feira, outubro 09, 2009
Lembrar do amanhã
São duas constantes observações do brother Hamilton. Ele considera que tenho uma memória prodigiosa por lembrar, com detalhes, de coisas muito antigas pelas quais passei. Dois ou três posts abaixo ele comenta exatamente isso. E eu, brincando, respondi que queria me LEMBRAR de coisas mais importantes, como os números que SERÃO sorteados na próxima mega-sena.
É, a piada é infame, eu sei. Mas meu estranho humor vê graça nela.
Então, na quarta-feira eu precisava passar numa farmácia e desci do ônibus nas imediações da República. É um caminho que faço de vez em nunca e que passa em frente uma banca de jornais que não vende jornais, mas livros. Muitos livros usados.
A memória, segundo o brother prodigiosa, não me permitiu lembrar da última vez que tinha passado por ali. Entretanto, assim que botei os olhos num livro chamado "Picasso" lembrei-me imediatamente de tê-lo visto ali por muitas e muitas vezes, exatamente naquela posição na banca, tomando sol, chuva. É esse aqui ó:
Vieram à mente recordações de um emprego no qual permaneci por uns quatro ou cinco anos, num bairro distante. É que justamente nessa época eu passava todo dia em frente à banca e nosso amigo pintor me olhava com o enigmático olhar meio escondido.
Mas o ser humano vai ficando mais velho e o valor do capital lhe corrompe as entranhas - poético ou piegas? - as lembranças suscitadas pela simples visão do livro foram substituídas imediatamente por questões mercadológicas. Comecei a pensar em por que aquele livro está ali por tantos anos e nunca é comprado. Enquanto me encaminhava para as escadas do metrô concluí que podia ser pela escolha da foto. "Picasso sempre passou um ideia de homem 'forte' e até arrogante, e nessa foto, meio querendo se esconder atrás da gola e entre o chapéu, ele parece bastante frágil. Acho que pode ser uma explicação para o fracasso na venda", pensei, antes de pegar o trem, sacar da mochila o livro que estou lendo e seguir para o trabalho.
Já na redação, abri o email, o twitter, o outlook e fui dar uma sapiada nas notícias do dia. Eis que me deparo com uma triste nota na Folha de São Paulo, que dizia "Fotógrafo Irving Penn morre aos 92 anos". Logo abaixo de um texto explicando a causa da morte estava uma montagem com quatro famosas imagens capturadas pelo falecido. Repare na imagem do quarto quadrante e diz aí se não é sinistro...
Não foi exatamente uma lembrança do futuro, mas começo a me policiar e espero que se um dia me lembrar inútil e estupidamente de seis números quaisquer eu tenha tempo de passar numa casa lotérica. Nunca se sabe, né?
Em tempo: os outros três personagens clicados pelo conceituado fotógrafo são Truman Capote, S.J. Perelman e a Gisele Bündchen.
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